"Continuam a morrer mulheres, vítimas desse famigerado flagelo. E nada se faz."

Nascida no Fundão e neta de judeus, daí o pseudónimo literário  em homenagem aos familiares ancestrais. 

A escritora tem 62 anos,é bacharel em Historia, ceramista de profissão, estudou pintura, cerâmica, desenho e História de Arte. Foi professora de cerâmica e pintura em várias escolas de Almada. Colaborou em vários projectos de cariz social, como a "Luta contra a Pobreza". Gosta de fotografia, viajar, escrever, pintar, ouvir música, criar jóias com os mais variados materiais e mais recentemente contemplar o mar sempre que possível e as condições atmosféricas assim o permitam.


Ela é Maria Israel.


BeeDynamicBooks- Quem é a autora do mundo fantástico de “A Redenção de Guadalest"?

Maria Israel- Quem sou? Nem sempre é fácil de falar de mim, mas neste momento e dadas as circunstâncias acho que vou ter mesmo que falar um pouco desta mulher que actualmente sou.

Depois de um AVC, que para além da mobilidade plena do braço direito, aquele que me dava vida a tudo o que eu amava, tal como, escultura em cerâmica, pintura, bijuteria, coisas, que até essa data eu fazia com as minha próprias mãos, e não como hoje o faço, só com uma mão, e no que respeita à escrita faça-o através do computador ... “Dói muito” não foi fácil, relativamente à escrita, demoro imenso tempo a escrever, porque, demoro imenso a encontrar as teclas e isso por vezes faz-me perder um pouco o fio à meada.

Não é fácil, alguém que há uns anos atrás escrevia com as duas mãos, escrever só com uma e ter ainda que estar a olhar para as teclas, quando era algo que eu fazia quase de olhos fechados e quando estava a escrever algo que me tocava ou dava muito gozo, a velocidade era quase igual à velocidades do pensamento, é doloroso … mas temos que olhar em frente e acreditar.

Hoje sou como sou. ... ainda há pouco, numa consulta com uma das médicas que me acompanha, ela me dá-me os parabéns pelo progresso que eu tenho tido. Segundo ela esse progresso é deve-se à minha força de vontade e ao facto de eu não ter desistido nunca. Agradeço a Deus não ter perdido a minha capacidade de escrever e o gosto pela escrita, mesmo demorando muito a transcrever o que a mente me dita, eu não desisto. E outra coisa que agradeço muito a Deus, foi ter recuperado a capacidade de conduzir, coisa sem a qual, me era sido difícil “viver”. Para uma mulher que desde os vinte anos tem a liberdade de se movimentar e ser autónoma ver-se limitada aos outros e aos transportes, não é fácil. Mas graças a Deus, seis meses após um novo exame em Alcoitão, e com a ajuda de um carro semi-adaptado a minha liberdade voltou. Não podemos nunca, desistir dos nossos sonhos. Essa é a fórmula mágica.

Esta minha incapacidade forçada, não me derrotou. Aprendi muito com esta perda, como por exemplo, aprender a pedir ajuda, que era algo que eu não fazia. É preciso acreditar que o amanhã nos trará algo mais, e acreditar também que os nossos sonhos só não se realizarão, se nós, não acreditarmos em nós próprios.

Não é fácil deitar-me com as minhas capacidades motoras, físicas, mentais e intelectuais todas, e acordar sem saber como vou expressar o que estou a sentir...

Foi difícil, mas para quem já perdeu uma filha de uma hora para a outra, logo, sem contar e sem que algo o fizesse prever, isto não foi nada... Tudo o que acontece na nossa vida acontece porque tem que acontecer, tem sempre uma razão de ser. Quem sabe, o que me aconteceu foi para parar um pouco e dedicar-me a coisas que andava a deixar um pouco para trás, como por exemplo escrever.


BDB- Escrever é uma paixão de que tamanho? Do que é capaz de abdicar para continuar a dedicar-se à escrita?

MI-Escrever agora mais do que nunca, para mim uma necessidade igual, ou muito próxima à necessidade de respirar. Através dela eu consigo expressar o que me vai na alma e quiçá ajudar pessoas que passaram pelo que eu passei.

Após a morte da minha filha, encontrei na escrita uma forma de exorcizar a minha dor. No papel eu brotava a minha dor dor e alegria, se fosse esse o caso, na forma que me apetecia, sem me sentir criticada ou cobrada. Os outros, não estão muitas vezes receptivos a escutar as nossas mágoas, o papel, esse, não. Esse está e ainda está, sempre pronto para mim...A Redenção de Guadalest surge para homenagear mulheres que sofrem ou já sofreram maus tratos. Mulheres vítimas, quer física, psicológica, moral, ou qualquer outra forma de discriminação. Todos nós devemos ter o direito a ser felizes, de expressar os nossos sentimentos, os nossos ideais sejam eles quais forem, e não sermos humilhados e maltratados só porque não somos como os outros querem que sejamos. A minha mãe foi vitima de violência domestica, e eu por arrasto fui vítima também.

Continuam a morrer anualmente mulheres de vítimas desse famigerado flagelo. E nada se faz. Os nossos governantes estão certamente muito mais interessados em criar novas formas de corrupção do que ajudar as mulheres e punir os agressores.

Posso não chegar muito longe, mas se o grito da Guadalest, se fizer ouvir e uma ou duas mulheres, o escutarem e de seguida tiverem a coragem de dar o salto e abandonarem, o flagelo que as amordaça, eu vou senti-me muito grata, e com o sentimento do dever cumprido.

Segundo algumas pessoas que trabalham na área, a Redenção de Guadalest contém em si um manancial de pistas, mesmo que sejam de uma forma romanceada, que as alertará e ajudará a dar o salto, digamos que este livro é um grito de esperança.

Nada é eterno...temos é que estar alerta e não podemos nunca deixar que nos aniquilem. Sejamos fortes e não deixemos nunca que nos maltratem.


BDB- Quais são os principais obstáculos com que se depara na divulgação do seu trabalho?

MI- A falta de divulgação. Sem dúvida. E acrescentaria também, encontrar o local certo para serem mostrados. A visibilidade é muito importante. As editoras deviam estar mais atentas e apresentar os seus autores nos variados programas de televisão. Como posso eu ter sucesso com o meu livro, se, para além dos meus amigos do facebook e pouco mais, quem mais sabe que eu escrevi A Redençao de Gadalest ?

É uma utopia não será? Cada livro tem o seu nicho de mercado, o seu próprio leitor. O que a mim me agrada não agradará certamente a si, àquele ou aquele outro... cada livro é um livro e há sempre alguém com o qual se irá identificar.

Eu tenho uma “biblioteca” razoável e alguns dos livros que dela fazem parte, não me identifico de todo com eles, não porque quem os escreveu seja maus escritor, mas pura e simplesmente, porque me vieram parar à mão no dia errado.

Por exemplo um dos autores portugueses que faz parte minha biblioteca, é o digníssimo escritor, José Cardoso Pires, e um dos livros que escreveu, que eu não compraria e não me sentiria impelida a ler se não tivesse visto um programa de televisão onde ele falava sobre o AVC do qual ele foi vítima, tal como eu. De Profundis, Valsa Lenta é o nome desse livro. Comprei-o confesso, porque ele mexeu comigo. Li-o depois pensei. - Porque o comprei?

Quando tive o AVC, soube a mensagem que aquele livro tinha para mim e compreendi porque me teria ele vindo parar às mãos...os livros têm destas coisas.

Como vê, a divulgação, os meios de comunicação social, podem levar-nos a locais inesperados, e o que ontem não me dizia nada, hoje é muito importante para mim. Obrigada, José Cardoso Pires.



BDB-Os leitores de Maria Israel vão poder continuar a contar com mais livros?

MI-Espero e desejo muito que sim. Está nas minhas e nas mãos de pessoas como você continuarem a ler mais historias da Maria Israel, dar visibilidade ao seu trabalho e à sua obra para que ela e outros escritores como ela tenham direito à visibilidade que merecem. Assim muito mais obras sairão certamente das gavetas.



BDB- Ainda somos um país de maus leitores?

MI-Infelizmente, ainda continua a haver muito parcos hábitos de leitura. Dão-se muitos brinquedos às crianças e os livros vão ficando para trás. Há tempo para jogos de computador, e para a leitura.

BDB.-O que é que os leitores de Maria Israel poderão encontrar de diferente no seu livro?

MI-Boa pergunta...Eu diria que poderão encontrar uma escrita simples e sentida. Eu gostaria que a minha escrita pudesse tocar no coração de todos que pegassem nos meus livros, e que lhes desse tanto prazer, como aquele que eu senti ao escrevê-los. Poderão também num futuro próximo, ver, ler e também deliciar-se com mais uma história da Maria Israel, como não pode deixar de ser, com mais um conto, de duas mulheres que tudo foram capazes de abdicar, para dar aos seus filhos, educação, saúde, alimento, tudo aquilo que eles mereciam para serem pessoas realizadas e felizes, em suma a realização dos seus sonhos. E mais não digo.




BDB- Conte-nos um segredo. Uma superstição, uma oração, uma crença. Qual é o seu ingrediente mágico para dar mais sabor a cada um dos seus dias?

MI-Segredo?!Agradecer tudo o que Deus me dá, como se o já tivesse recebido, não questionando nunca porquê. O ingrediente mágico para dar mais sabor a meus dias? Talvez acreditar que amanhã o dia raiará límpido, sem nuvens, e que sol aquecerá o coração de todos os Homens.


BDB- Para finalizar, felicidade para si…. É?

MI-A felicidade é ver os meus netos correrem para mim, com os sorriso rasgado, como se não houvesse amanhã.




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